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Atingidos pela duplicação da BR-381 defendem assentamento humanizado

Em reunião nesta quinta (29), DNIT e Justiça Federal afirmam estar dialogando com a comunidade na busca de uma solução possível.
Várias famílias impactadas pela desapropriação decorrente das obras na BR-381 compareceram à audiência. Foto: Henrique Chendes ALMG
quinta-feira, 30 outubro, 2025

Atingidos pelas obras de duplicação da BR-381 no trecho que corta Belo Horizonte, entre a Avenida Cristiano Machado e o Rio das Velhas defenderam o reassentamento humanizado de suas famílias. Representantes desse segmento, junto com autoridades federais, participaram de reunião sobre o tema da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede), que requereu a audiência pública, disse que o objetivo era organizar o diálogo entre todos os grupos e poderes envolvidos na discussão, de modo a garantir que o reassentamento fosse realizado de forma transparente, dialogada, segura e digna.

“Defendo que essa rodovia seja duplicada o quanto antes, mas devemos fazer esta expansão garantindo às famílias moradoras dali há décadas que o remanejamento seja feito com dignidade”, propôs.

Proposta de reassentamento para esse público foi apresentada pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e pela Justiça Federal. Agora, ela deve ser homologada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no dia 7 de novembro, na Capital. Uma das áreas mais afetadas é a Vila da Luz, na região nordeste de Belo Horizonte, que abriga cerca de 1,1 mil moradores.

Núbia Ribeiro, presidente da Comunidade dos Moradores em Área de Risco (CMAR), que solicitou a reunião à parlamentar, reforçou que a realocação de todos os moradores deve ser realizada de forma humanizada. Participante do movimento dos atingidos desde o início em 2006, Núbia disse que em 2016 buscou apoio da ALMG, mas não conseguiu marcar a audiência. E somente agora, com apoio da deputada, foi possível conquistar esse objetivo. 

Ednéia Aparecida de Souza, dirigente do Movimento Nacional de Luta pela Moradia, apresentou um relatório da Prefeitura de Belo Horizonte de 2012. No documento, é apresentado um empreendimento no bairro Capitão Eduardo (Região Nordeste da Capital), de construção de 4 mil moradias para pessoas carentes. Ela questionou que agora os responsáveis pelo reassentamento da BR-381 do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) estão oferecendo o mesmo terreno para as famílias atingidas.

Casas, em vez de apartamentos

Moradora da Vila da Luz, Valéria Lúcia se emociona ao falar de suas dificuldades de obter sua casa própria. Foto: Henrique Chendes ALMG

Edneia de Souza criticou ainda a proposta do órgão para os moradores das margens da rodovia, a qual prevê apartamentos, em vez de casas. Lembrou do reassentamento de famílias do Jardim Vitória, há dez anos, quando construíram 2 mil apartamentos: Atualmente, a maioria das famílias está sendo despejada, porque não consegue fazer frente às despesas das moradias, o que inclui o pagamento de água, luz, condomínio e outros.

“A Lei é clara: se você não paga condomínio, eles têm o direito de penhorar sua casa e leiloá-la; e muitas pessoas que ocuparam os apartamentos ganham salário-mínimo e estão sendo despejadas”, afirmou. Para Edneia, no debate sobre o reassentamento da 381, é importante considerar o modo de vida das pessoas, para evitar que se repita a situação do Jardim Vitória.

Maria Teresa dos Santos, também moradora das margens da BR-381, trouxe a demanda de um morador que não quis se identificar, atualmente encarcerado. Outra pessoa ocupou a casa do primeiro, o qual agora tem medo de perder a moradia, pois ela pode ser repassada ao morador atual. “Peço que nos ajudem a resolver essa questão para garantir a moradia das pessoas encarceradas e de outras que foram obrigadas a sair de suas casas”, solicitou Maria Teresa.

Moradores foram ao microfone e relataram dificuldades para morar em apartamentos. Muitos têm animais e plantas ou pessoas com deficiência ou dificuldades pessoais. É o caso de Delfina Rodrigues, que mora há 29 anos na vila. Além de possuir dois cachorros e três gatos, ela ainda sofre de artrose na lombar e nos joelhos o que a impede de subir e descer escadas.

De forma resumida, membros da comunidade defenderam as seguintes propostas para a recolocação deles: a opção de compra assistida, além da realocação em prédios; atualização dos valores pagos pelas casas atingidas; oferecimento de casas, além de apartamentos.

DNIT diz que sua meta é garantir moradia digna

“A nossa proposta é de garantir moradia digna, com reassentamento humanizado, tanto na Vila da Luz quanto em outras comunidades atingidas pela obra da BR-381”, afirmou Leandro Tito Muniz. Chefe de desapropriação, reassentamento e meio ambiente da Superintendência Regional do DNIT em Minas Gerais, ele disse que realizou há dois meses reunião na Vila da Luz. E que já está sendo promovida a selagem das moradias, além das pesquisas com a população local e recebimento da documentação.

Michele Fragoso, coordenadora nacional de desapropriação e reassentamento do DNIT, acrescentou que a identificação das famílias na faixa de domínio é fundamental: “Precisamos do número correto de pessoas atingidas para fazermos um estudo mais consistente e apresentarmos a proposta; sei que não é tranquilo, porque vocês vão sair de suas casas, mas vamos fazer da melhor forma possível”, prometeu.

Comissões fundiárias no Judiciário

Cláudio Fonseca de Pina, juiz federal da 2ª Vara Judiciária de Sete Lagoas do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, rememorou que a luta dessa comunidade começou em 2006: “Chegou uma carta de despejo do DNIT, propondo a retirada de todas pessoas do local, sem nenhuma contrapartida”.

Disse que a discussão sobre moradia é nova no Judiciário brasileiro, pois se trata de uma questão social. “O problema da habitação nos acompanha desde a formação do estado brasileiro e nunca tivemos uma solução estrutural”, avaliou. Em Minas, um avanço se deu em 2017, quando a justiça obteve o reassentamento de cerca de 300 famílias da Vila da Paz e da Vila Pica-pau.

Já em 2021, relatou o juiz, foi editada pelo Supremo Tribunal Federal a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, que suspendeu despejos e remoções forçadas de famílias vulneráveis durante a pandemia de Covid-19. A medida também estabeleceu a criação de comissões de soluções fundiárias no Judiciário, o que foi feito em Minas Gerais.

“Nosso papel hoje é intermediar a relação entre a comunidade e os responsáveis pela obra da BR; buscando soluções dentro do que temos”, afirmou. “Já nos reunimos com os moradores e o DNIT e vamos fazer outras reuniões, para buscar a solução possível, real e que dê dignidade de moradia a todos os envolvidos”, declarou.

Respondendo a questionamentos do público, Cláudio Pina explicou que para o assentamento atual, a prefeitura ofereceu Capitão Eduardo porque é a única área disponível na Capital capaz de abrigar as 2 mil famílias que serão realocadas. Disse que está sendo usado a linha do Minha Casa Minha Vida destinada a populações impactadas por obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Pelas regras desse financiamento, segundo o juiz, o reassentamento precisa ser coletivo até para preservar os laços econômicos, afetivos e sociais da comunidade. Também afirmou que não há área disponível para construir tantas casas como sugeridas, daí a opção por apartamentos.

Leandro Muniz completou a fala do juiz, afirmando que os estudos do Dnit vão ajudar a resolver demandas possíveis, como, por exemplo, unidades no térreo com acessibilidade para quem tem dificuldade de locomoção.

Representação real, não apenas formal

O advogado Henrique Castro, que atua em causas de pessoas atingidas por barragens e outros grandes empreendimentos, defendeu ser necessária a simetria técnica entre DNIT e representação da comunidade: “O DNIT chega com laudos completos e as pessoas não têm condições de responder a altura; foi constituída a CMAR, mas sem condições técnicas, sem estrutura”.

Para ele, é necessário que as pessoas sejam ouvidas e que tenham representação real, e não apenas formal. “Elas devem ser colocadas no centro de tudo, para que possamos chamar esse reassentamento de humanizado”, concluiu.

Também advogado de movimentos populares, o vereador de Uberlândia Igino Oliveira defendeu que as pessoas moradores de casas devem ser assentadas em casas, e não em prédios.

O defensor público federal Eduardo Paredes de Carvalho lamentou que no Brasil a maior parte da população ainda seja invisibilizada. “Que a chamada ‘rodovia da morte’ seja transformada em rodovia da vida e de visibilização das pessoas”, propôs.

Ao final da reunião, a deputada Ana Paula Siqueira anunciou que vai solicitar uma visita à comunidade para apurar as condições das famílias. Ela também sugeriu a criação de um grupo de trabalho formado por moradores, parlamentares e os órgãos envolvidos no processo de reassentamento, para acompanhar o desenvolvimento do reassentamento e buscar soluções para as várias demandas individuais e específicas apresentadas durante a reunião.

Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais

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