Uma audiência pública realizada na tarde desta segunda-feira (20), na Câmara Municipal de Governador Valadares, discutiu os direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no município. A proposição foi do vereador Jepherson Madureira, que destacou ser esta a terceira audiência voltada ao tema.
Ao abrir o encontro, o parlamentar ressaltou que, apesar da existência de leis e políticas públicas, ainda há inúmeros desafios a serem enfrentados. Ele citou avanços como a construção de um espaço de acolhimento às famílias atípicas (Casa Semente), que oferecerá atendimento psicológico aos pais e acompanhamento às pessoas autistas.
"Temos leis aprovadas nesta Casa que nasceram de audiências públicas como esta. Mas ainda há muito a ser feito", afirmou Jepherson.
Participação de profissionais e instituições
Entre os participantes, a psicóloga Marcela Rezende, referência em TDAH e transtornos do neurodesenvolvimento, destacou a importância de manter o debate constante.
"É sempre fundamental se reunir e repensar políticas públicas e estratégias voltadas às pessoas neurodivergentes", disse.
Lucimária, representante do Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSi), ressaltou que discutir o autismo é também discutir inclusão social.
"O CAPSi trabalha com diagnóstico e acompanhamento de diversos transtornos. Fazemos saúde, mas precisamos também de inclusão e de uma cidade que acolha todos os transtornos", afirmou.
A psicóloga Laura Caribé, da Casa Unimed, destacou o compromisso da rede privada com a comunidade valadarense.
"Grande parte do nosso público é formado por pessoas autistas. A Unimed quer cuidar de seus beneficiários, mas também agregar benefícios à comunidade", pontuou.
A assistente social Fabíola Valente reforçou a relevância da Câmara como espaço de diálogo.
"É por meio da escuta que se constroem políticas dignas, principalmente para o espectro autista. Avançamos, mas ainda há muito o que lutar", afirmou.
Representando as mães atípicas, Valesca, integrante do Projeto Libélula, disse que participava como mãe e esposa de autistas.
"Trago um pouco da nossa experiência, das nossas demandas e das sofrências, que não são poucas", desabafou.
A idealizadora do Projeto Libélula, Maiana Furtado, lamentou o baixo comparecimento do público.
"Essa audiência é muito significativa, mas é triste ver o auditório vazio", disse.
Cobranças e críticas
Durante o debate, o vereador Jepherson Madureira reforçou que a Câmara é porta-voz das famílias atípicas, mas cobrou o cumprimento das leis por parte do Executivo.
"A gratuidade do transporte público para acompanhantes de pessoas com TEA foi aprovada nesta Casa e não é cumprida. Se a Mobi não respeita as leis municipais, tem que dar espaço a outra empresa", criticou.
As mães presentes relataram dificuldades cotidianas e falta de estrutura na rede pública.
Elisângela, moradora do distrito de Brejaubinha, lamentou a ausência de vereadores na audiência - apenas seis dos 21 compareceram - e relatou casos de bullying e despreparo escolar.
"Meu filho ficou afastado dez dias da escola. Se os próprios gestores não sabem lidar com o autismo, como os colegas vão entender?", questionou.
Marcely denunciou a falta de acompanhamento adequado e o custo elevado das medicações.
"Já deixei de comer para comprar remédio. O transporte gratuito só vale para terapias com horário marcado. Ela também cobrou que os bairros tenham atendimento/terapia nos postos de saúde. "Ir ao centro com o menino é cansativo", contou. A mãe atípica também criticou o uso político do tema: "O autismo não pode virar moeda de troca em eleição".
Lívia, mãe de um menino autista de 9 anos, relatou o despreparo de profissionais da educação.
"Quando buscamos nossos direitos, dizem que queremos privilégios. Queremos apenas respeito. Nossos filhos são bênçãos, e não culpa nossa", afirmou emocionada.
Thainam denunciou o preconceito sofrido pela filha.
"Uma professora a chamou de retardada porque errou uma questão de matemática", contou, além de reclamar da demora por atendimentos de fonoaudiologia.
O servidor Felipe, que é autista, defendeu que os próprios autistas sejam vistos como cidadãos ativos.
"O poder público não pode ver o autista como coitado, mas como alguém capaz de contribuir com a sociedade, do seu jeito", declarou.
Propostas apresentadas
Encerrando a audiência, o vereador Jepherson Madureira listou propostas encaminhadas a partir das demandas levantadas no encontro:
- Cumprimento da gratuidade no transporte público (PL 94/2024);
- Criação do Disque-Autista, canal de denúncias e orientações;
- Implantação da Casa Semente, espaço de diagnóstico e atendimento integral às famílias;
- Redução de jornada para servidores municipais que sejam pais ou mães atípicos;
- Terapias nos postos de saúde dos bairros;
- Capacitação de monitores escolares;
- Ampliação do atendimento a jovens e adolescentes com Transtorno do Espectro Autista pelas equipes de Saúde da Família;
- Convocação da secretária de Educação para discutir melhorias no atendimento às crianças autistas.
"Este é um momento de diálogo e consulta para a construção de políticas públicas mais inclusivas na cidade", concluiu o parlamentar.




Fotos: Divulgação Câmara de GV