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Descubra cinco gatilhos da Páscoa que induzem ao consumo impulsivo

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates (Abicab), em 2024, o setor movimentou mais de R$3 bilhões apenas no período pascal.
Ovo de Páscoa. Foto: Reprodução da Internet
quarta-feira, 9 abril, 2025

*Adriano Santos, sócio da Tamer Comunicação

Ao acessar as redes sociais, deparamo-nos com um vídeo cuidadosamente produzido: uma avó é surpreendida por um presente simbólico da neta, envolto em emoção e referências afetivas.

No YouTube, outra campanha publicitária investe em narrativa cinematográfica para mostrar a reconciliação entre pai e filho por meio de um gesto aparentemente simples — a entrega de um ovo de chocolate.

Já no Instagram, proliferam anúncios com embalagens sofisticadas, brindes exclusivos e mensagens de urgência comercial. Esse movimento não é acidental: trata-se de uma estratégia coordenada.

Embora tradicionalmente associada a valores espirituais e ao convívio familiar, a Páscoa foi, progressivamente, ressignificada como um evento de apelo comercial.

Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates (Abicab), em 2024, o setor movimentou mais de R$3 bilhões apenas no período pascal.

A publicidade tornou-se protagonista nesse processo, articulando emoções, valores sociais e práticas de consumo.

A construção de narrativas sensíveis, associadas à infância, à partilha e à afetividade, revela-se eficiente para estimular decisões motivadas não pela necessidade, mas pela expectativa simbólica atribuída ao presente.

A seguir, cinco mecanismos utilizados pelo mercado para impulsionar o consumo na Páscoa:

Ativação da memória afetiva

Estratégias publicitárias comumente acionam registros emocionais ligados a experiências passadas — sobretudo aquelas vividas no contexto familiar.

Tais memórias, ainda que idealizadas, operam como âncoras psicológicas e tendem a criar uma predisposição favorável ao consumo.

Ao remeter o público a vivências tidas como genuínas, o mercado associa seus produtos a sensações de segurança, continuidade e pertencimento.

A compra, nesse contexto, transforma-se em tentativa de resgate emocional, deslocando-se da racionalidade econômica para o campo simbólico.

Estímulo à reciprocidade social

A publicidade pascal frequentemente explora o imperativo da partilha. A expectativa de presentear colegas, familiares ou profissionais do convívio cotidiano é reiterada por campanhas que vinculam afeto à materialidade do presente.

Esse fenômeno, que o economista comportamental Dan Ariely já descreveu como “contrato social implícito”, gera um ambiente de pressão silenciosa, no qual a ausência do gesto material pode ser interpretada como negligência afetiva. O resultado é a ampliação do consumo por obrigação moral, e não por decisão autônoma.

Ofertas com valor ilusório

Descontos atrativos, promoções com tempo limitado e “combos exclusivos” são estratégias recorrentes neste período.

Em muitos casos, os preços previamente inflacionados são reduzidos apenas superficialmente, criando a sensação de vantagem econômica.

Trata-se de uma tática de ancoragem — conceito bem explorado por Daniel Kahneman — em que o primeiro valor apresentado serve como referência para qualquer comparação subsequente.

O consumidor, conduzido por esse viés cognitivo, tende a interpretar como oportunidade aquilo que, na realidade, representa uma distorção do valor real.

Escassez planejada e edição limitada

A noção de exclusividade é instrumentalizada por meio de produtos sazonais e coleções temáticas. O princípio da escassez — descrito por Robert Cialdini como um dos gatilhos mentais mais poderosos — é utilizado para acelerar decisões de compra.

“Últimos dias”, “edição especial” e “só até domingo” são enunciados que induzem uma sensação de urgência, levando o consumidor a agir sob a lógica da antecipação da perda.

O efeito psicológico é intensificado por um cenário saturado de estímulos visuais e emocionais, que reduz a capacidade crítica e estimula respostas automáticas.

Gamificação da experiência de compra

Muitas marcas apostam em experiências interativas para transformar o ato de comprar em um momento lúdico.

Caça aos ovos em realidade aumentada, quizzes com brindes digitais e sorteios vinculados a ações sociais são exemplos disso.

Esses recursos deslocam o foco do produto para a vivência, estimulando a participação ativa do consumidor.

A sensação de engajamento, somada à promessa de recompensa, reforça o vínculo emocional com a marca e potencializa a conversão em vendas.

Trata-se de uma estratégia que une entretenimento e desejo, numa lógica de encantamento contínuo.

Mais do que um simples feriado, a Páscoa tornou-se um sofisticado laboratório de consumo emocional.

Os gatilhos acionados pelo mercado não apenas impulsionam vendas, mas moldam comportamentos e valores.

Ao converter afetos em produtos e vínculos em transações, a lógica publicitária transforma gestos simbólicos em imperativos comerciais.

Compre com consciência — mas saiba identificar quando está levando emoção na embalagem e pagando por ela como se fosse chocolate.

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