Cirurgiões dentistas demandaram o reconhecimento da profissão e da capacidade para a realização de cirurgias estéticas faciais em audiência pública nesta quinta-feira (25/9/25). Por outro lado, representantes de entidades médicas se manifestaram de forma contrária à ideia.
Eles participaram de audiência pública da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), solicitada pelo deputado Lincoln Drumond (PL).
Presidente do Conselho Regional de Odontologia de Minas Gerais, Raphael Mota, defendeu que os profissionais têm formação adequada pra realizar cirurgias estéticas faciais.
“Faz parte das nossas atribuições cirurgias para corrigir traumas, mutilações decorrentes de câncer de cabeça e pescoço e reconstrução do rosto de crianças com lábio leporino.”
Raphael Mota - Presidente do Conselho Regional de Odontologia de Minas Gerais
Ele acrescentou: “Mas isso não é questionado porque é uma cirurgia que não dá dinheiro, feita muitas vezes pelo SUS”.
Como contou, o Conselho Federal de Odontologia ainda não chegou a um consenso sobre a ampliação das cirurgias estéticas para cirurgiões dentistas. Mas, disse, que há essa expectativa por parte dos profissionais.
No caso de haver essa ampliação, Raphael Mota defendeu que seja discutido como realizar os procedimentos com segurança, responsabilidade e em local adequado.
Lei não especificaria atribuições da Odontologia
Procuradora externa do Conselho Regional de Odontologia (CRO) de Minas Gerais e advogada especialista em Direito Médico e da Saúde, Thaís Canêdo, explicou que a Odontologia é regulamentada pela Lei Federal 5.081, de 1966, segundo a qual o profissional pode atuar em qualquer área da especialidade aprendida em graduação e pós-graduação. Portanto, como disse, ela não especifica a área de atuação.
Como contou, nesse sentido, resoluções foram editadas para dar transparência a isso e estabelecer os limites da profissão. De acordo com ela, dentistas não só lidam com a boca, mas também com cabeça e pescoço.
“Poucos sabem da capacidade legal da Odontologia. A cirurgia facial já é uma realidade da profissão desde 1960. E algumas cirurgias estéticas faciais já foram liberadas e deve haver uma liberação maior posteriormente”, disse.
Para a advogada a grande questão a se pensar diz respeito ao fato de que o cirurgião bucomaxilofacial pode atuar em cirurgias para tratar traumas e deformidades congênitas, procedimentos complexos, mas não pode realizar cirurgia estética facial que tenha o mesmo fundamento. “Trata-se de um contrassenso normativo”, afirmou.
O advogado especialista em Direito Odontológico, Érico Servano, reforçou a fala. Ele acrescentou que é permitido a um dentista realizar um lifting facial para tratar paralisia, mas não um lifting puramente para finalidade estética.
Profissionais já lidariam com procedimentos complexos
Segundo o cirurgião bucomaxilofacial Sandro Santana, parte do descontentamento de algumas entidades médicas em relação à profissão é por falta de conhecimento do que o profissional está apto a realizar e ao tempo que dedicou à sua formação.
Graduado em Odontologia pela Universidade Federal de Alfenas, com mestrado em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela Universidade Federal de Uberlândia e doutorado em Biologia Oral pela Universidade de São Paulo, ele detalhou alguns procedimentos que o profissional pode executar: desde uma cirurgia menor como extração de dente até outros mais complexos para tratar patologias como tumores.
“É funcional, mas também é estético. Não há como negar.” Sandro Santana - Cirurgião bucomaxilofacial
Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial e professor associado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Antônio Luis Neto, enfatizou que o cirurgião dentista tem conhecimento e preparo em anatomia da face. “Nossa visão é a de somar conhecimento em prol do paciente”, falou.
Para a doutora em Odontologia pela UFMG, Patrícia Guedes, cirurgiões dentistas têm qualificação para realizar cirurgias faciais. “Precisamos é de uma normatização rigorosa que exija capacitação séria dos profissionais para atuarem na área”, defendeu.
Médicos defendem que cirurgiões plásticos façam cirurgias estéticas
De acordo com o diretor do Departamento Nacional de Defesa de Cirúrgica Plástica (Denade) e representante da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Vagner Rocha, a Lei do Ato Médico sofreu mudanças ao longo do tempo, deixando brechas que estão sendo ocupadas por oportunismo.
“Vemos conselhos que se aproveitam de resoluções e apresentam pareceres para confundir o poder público”, afirmou.
Ele lembrou do tempo dedicado para a formação em Cirurgia Plástica: seis anos para concluir Medicina, três anos para Cirurgia Geral e outros três anos para Cirurgia Plástica, totalizando cerca de 25 mil horas de estudo.
O médico, que coordenou a urgência e emergência do Hospital João XXIII, enfatizou ainda o tempo que é preciso se dedicar aos pacientes operados.
Na opinião dele, não pode haver uma flexibilização na lei, permitindo que cirurgiões dentistas possam realizar cirurgias estéticas faciais sob pena de haver ainda mais pessoas com sequelas vítimas de erros.
Concordou com ele o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Regional Minas Gerais, Kennedy Rossi, que atua em hospital pelo SUS e se dedica a cirurgias reparadoras há cerca de 30 anos. “Odontologia tem valor e importância, mas a maioria das atribuições diz respeito a tratamento dentário”, disse.
Ele ainda questionou até que ponto dentistas chegarão ao atuarem na harmonização facial, atualmente permitida.
“Vemos casos de necrose de nariz, lábio, cegueira. Nos últimos três anos, recebemos denúncias de mais de 200 casos. Não é tão pouco assim e sabemos que nem todas chegam até nós.”
Kennedy Rossi - Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Regional Minas Gerais
O membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgias Plásticas e representante do Conselho Regional de Medicina, Marcelo Versiani, criticou a tentativa de mudar norma sobre atribuições da Odontologia. Em sua opinião, o interesse da população fica em último lugar nesse caso.
Segundo o advogado Henrique Naves, há uma tentativa da Odontologia de ganhar mais espaço, avançando em áreas da Medicina. “Estão sendo realizadas corriqueiramente cirurgias plásticas faciais por dentistas e não há amparo legal para isso”, denunciou.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais