Personalidade Borderline: uma condição marcada pela sensibilidade emocional e pela instabilidade nas relações
Por Dr. Francis Moreira da Silveira, MsC, Ph.D. Médico Psiquiatra CRM MG 55307 RQE 44612/ 63110
A personalidade borderline, também chamada de personalidade emocionalmente instável, é uma condição reconhecida nos principais sistemas diagnósticos internacionais — o DSM-5-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais) e a CID-11 (Classificação Internacional de Doenças). Ela pertence ao grupo conhecido como Cluster B, caracterizado por padrões de comportamento em que predominam intensidade emocional, impulsividade e dificuldade na regulação afetiva.
De acordo com o DSM-5-TR, o Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) é um padrão persistente de instabilidade nas relações interpessoais, na autoimagem e nos afetos, associado à impulsividade. Essas características tendem a se manifestar desde o início da vida adulta e permanecem estáveis ao longo do tempo, impactando diferentes áreas da vida da pessoa.
A CID-11 classifica essa condição sob o código 6D10.3 — Transtorno de Personalidade com Padrão Borderline, destacando três aspectos principais:
· dificuldade de controle emocional,
· sensibilidade intensa à rejeição e ao abandono,
· oscilações na percepção de si mesmo e nas relações com os outros.
O foco atual da classificação internacional é compreender a gravidade do prejuízo no funcionamento pessoal e interpessoal, em vez de rotular a pessoa por traços isolados.
Pessoas com traços borderline podem apresentar:
· medo intenso de serem rejeitadas;
· relacionamentos que alternam momentos de proximidade e afastamento;
· sentimentos de vazio ou falta de propósito;
· impulsividade (como gastos, alimentação, sexualidade, uso de substâncias ou direção);
· flutuações afetivas perceptíveis;
· dificuldade em controlar a raiva;
· episódios de sofrimento intenso, podendo incluir automutilação ou pensamentos de morte.
Esses comportamentos não devem ser entendidos como manipulação ou falta de caráter, mas como sinais de sofrimento psíquico e dificuldade na regulação das emoções.
O transtorno resulta de uma interação complexa entre fatores biológicos, psicológicos e ambientais. Pesquisas indicam alterações neurobiológicas em áreas cerebrais relacionadas à emoção e ao controle de impulsos, como a amígdala e o córtex pré-frontal. Experiências precoces adversas, como abandono, negligência ou ambientes familiares instáveis, podem contribuir para o desenvolvimento do quadro, especialmente em pessoas com vulnerabilidade genética.
A Terapia Dialética Comportamental (DBT) e outras abordagens psicoterápicas baseadas em evidências ajudam na regulação emocional, no controle de impulsos e na melhoria das relações interpessoais.
O uso de medicamentos (como antidepressivos, estabilizadores do humor ou antipsicóticos atípicos) pode ser indicado para reduzir sintomas específicos, sempre sob acompanhamento médico. A continuidade do cuidado, o estabelecimento de vínculo terapêutico sólido e o suporte familiar adequado são fundamentais para o bom prognóstico.
A compreensão contemporânea da personalidade borderline enfatiza a humanização do cuidado e o combate ao estigma. Trata-se de uma condição clínica legítima, que requer acolhimento, empatia e acompanhamento especializado, não rótulos ou julgamentos. O objetivo do tratamento é promover autonomia, estabilidade emocional e qualidade de vida, e não eliminar traços de personalidade, mas compreender e gerenciar suas manifestações.
A personalidade borderline representa um padrão de funcionamento emocional em que há maior sensibilidade e vulnerabilidade diante das experiências interpessoais.
O reconhecimento precoce, o tratamento multidisciplinar e a educação sobre o tema são medidas que reduzem o sofrimento e favorecem a inclusão social. Mais do que um diagnóstico, trata-se de compreender a pessoa em sua totalidade: com história, emoções e potencial de desenvolvimento.





