“Zema ladrão, a Copasa é do povão!”, “eu já falei, falo de novo: a Copasa é do povo!”, “a Copasa é nossa!”. Entoando gritos de protesto, milhares de trabalhadores da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) ocupam o Auditório José Alencar e o Espaço Democrático José Aparecido de Oliveira, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), desde o início da manhã desta quarta-feira (22/10/25).
A manifestação ocorre durante audiência pública da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/23, de autoria do governador Romeu Zema (Novo), cujo objetivo é facilitar a privatização ou federalização da empresa estatal de saneamento básico, ao derrubar a exigência de referendo popular para concretizar a venda.
A reunião é um pedido dos 20 parlamentares que compõem o bloco de oposição Democracia e Luta. “São mais de 6 mil pessoas hoje aqui presentes”, destacou o presidente da Comissão do Trabalho, deputado Betão (PT), um dos signatários do requerimento.
A mobilização massiva foi classificada como “um dia histórico para o movimento sindical” por Jairo Nogueira, presidente da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT-MG). Ele lembrou uma pesquisa recente da Rádio Itatiaia que mostrou que 66% da população mineira é contra a retirada da consulta popular para a privatização.
Sergio Nobre, presidente nacional da CUT, afirmou ter acompanhado outros processos de privatização pelo País. “Quando privatizam uma empresa pública, a primeira coisa que fazem é a demissão de trabalhadores e o rebaixamento de salários”, disse o líder sindical. “Não cometam o crime que cometeram com a Sabesp”, completou, fazendo referência à experiência de privatização da empresa de saneamento do Estado de São Paulo.
O coordenador-geral do Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais (Sindieletro MG) Emerson Andrada Leite, que representa os servidores da Cemig, criticou o fato de nunca ter havido um debate público sobre as consequências positivas da privatização. “É importante que o governo aponte onde a privatização do saneamento deu certo, onde a população teve acesso a uma água mais limpa e um serviço de qualidade. Isso nunca aconteceu”, afirmou.
Lideranças sindicais das áreas da Educação, dos Correios e do Itamaraty, também presentes na audiência, prestaram solidariedade aos trabalhadores da Copasa e se manifestaram contrários à PEC 24/23. O movimento recebeu apoio ainda de vereadores dos municípios de Pedro Leopoldo, Contagem e Belo Horizonte, além de representantes de movimentos da juventude.
Privatização levará à universalização do serviço, defende governo
Frederico Amaral e Silva, secretário-adjunto de Desenvolvimento Econômico do Governo de Minas Gerais, justificou a venda da Copasa como mais uma estratégia para amortização da dívida do Estado com a União, como parte da adesão ao Programa do Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag).
Segundo ele, os recursos da transferência da estatal seriam utilizados para se alcançar os 20% de amortização necessários para obtenção de juros zero, uma das regras do programa. Além disso, tais recursos poderiam ainda ser alocados em investimentos obrigatórios em Educação e Saúde previstos no Propag. “O Estado hoje não tem capacidade financeira de realizar esses investimentos sem a desestatização de algumas de suas empresas”, informou.
Outra justificativa seria a necessidade de universalizar o saneamento em Minas Gerais, meta estabelecida pelo Marco Legal do Saneamento até o ano de 2033. “São quase 4 milhões de mineiros sem acesso a água potável. É para essas pessoas que estamos trabalhando”, justificou Frederico Amaral e Silva.
Ainda de acordo com o secretário-adjunto, 293 municípios mineiros não são atendidos com o esgotamento sanitário e a privatização da Copasa permitiria preencher essa lacuna. “A empresa necessita de mais eficiência e redução da burocracia”.
O diretor-presidente da Copasa, Fernando Passalio de Avelar, reiterou a fala do representante do governo. “Esse é o verdadeiro desafio: garantir água e esgoto tratado para todos os mineiros", destacou, afirmando ser urgente a necessidade de universalização.
Sobre o temor a demissões de trabalhadores com a possível privatização, o presidente da empresa disse que dados recentes mostram que o Brasil vai precisar de 1 milhão e meio de trabalhadores até 2033 no setor de saneamento, segmento que disse ser o que mais gera empregos no País. "O cenário hoje não é de demissão", afirmou.
Ele ainda citou dados positivos acerca do desempenho da empresa em sua gestão como presidente, com redução de 53% em acidentes de trabalho desde 2019 e do tempo de resposta a inconformidades graves. Disse ainda que a Copasa tem no momento seu maior plano de investimentos, de R$ 17 bilhões até 2029. "A empresa vive hoje um de seus melhores momentos, mas a universalização exige mais agilidade, eficiência, competitividade e mais pessoas", justificou.
Sindicato rebate afirmações
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Minas Gerais (Sindágua), Eduardo Pereira de Oliveira, contrapôs a fala dos representantes do governo. Segundo ele, ambos "mentiram descaradamente" em suas falas. Citou como exemplo casos de mortes de trabalhadores por acidentes em serviço, como os que teriam ocorridos em cidades como Salinas (Região Norte), Divinópolis (Centro-Oeste) e Cabo Verde (Sul).
"Quero ver a empresa falar para essas famílias que os acidentes estão diminuindo. A Copasa está é matando trabalhadores, por isso afirmo que o presidente é mentiroso", rebateu, explicando que embora o número total de acidentes possa ter diminuído, a quantidade de incidentes fatais tem aumentado.
Sobre a fala do secretário de que a emresa precisa ser privatizada para ter recursos para investimentos do governo, o líder sindical avaliou que a afirmação foi desmetida pelo próprio presidente da empresa, quando este anunciou investimentos de R$ 17 bi na companhia nos próximos quatro anos.
O sindicalista também exibiu notícias veiculadas na imprensa e estudos que na sua avaliação mostrariam "Copasas diferentes". Em uma delas, o vice-governador Mateus Simões teria questionado investimentos na Copasa sendo feitos à beira da privatização. Em outra, mais antiga, a Copasa é destacada, como tendo atingido em 2021 a universalização de água tratada. E numa mais recente, o governador Romeu Zema afirma que a venda será transparente.
"De qual Copasa estamos falando?", questionou sobre discursos diferentes, que de um lado defendem a privatização com transparência, mas sem ouvir a população no referendo; e de outro justificam a ideia de venda pela necessidade de investimentos já anunciados.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais