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Subfinanciamento e defasagem salarial ameaçam continuidade do Samu

Governo federal não cumpre previsão legal de financiamento e servidores não tem reajustes salariais.
Profissionais do Samu compareceram em grande número à reunião na Assembleia de Minas. Foto: Willian Dias ALMG
quarta-feira, 22 outubro, 2025

“Eles colocam na nossa mão uma ambulância de R$ 700 mil e querem pagar R$ 1,5 mil para a gente conduzir”. Com esse desabafo, o condutor socorrista Marcos Vinícius Ramos, do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) em Raul Soares (Rio Doce), resumiu a desesperança e a indignação desses profissionais e o grave subfinanciamento desse serviço no Estado e no País. O debate aconteceu em audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (21/10/25).

A reunião foi organizada pela Comissão de Administração Pública, atendendo requerimento da deputada Beatriz Cerqueira (PT). “Não se faz serviço público de qualidade sem a valorização dos servidores”, justificou ela em sua fala inicial. Ela cobrou, entre outros pontos, um compromisso do governo para viabilizar a aprovação do Projeto de Lei (PL) 441/23, do deputado Arlen Santiago (Avante), que trata da regulamentação da função de condutor socorrista e seu enquadramento na área da saúde. O projeto aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça desde abril de 2023.

O Samu é operado em Minas Gerais por meio de consórcios intermunicipais que, por lei, deveriam ser financiados pela União (50%), pelo Estado (25%) e pelos municípios (25%). O grande problema foi explicado pela secretária executiva da Rede de Urgência Centro Sul (Cisru), Ormesinda Salgado. Segundo ela, o governo federal congelou seus repasses durante dez anos, entre 2012 e 2022. Isso fez com que Estados e municípios passassem a assumir a maior parte do custeio.

Em 2025, segundo Ormesinda Salgado, a União assumiu 25,9% do custeio, o Estado pagou 47,68% e os municípios, 26,42% em todo o País. Em 2023, o déficit na contribuição federal chegou a 72%. Na época, a então ministra Nísia Trindade alegou dificuldades orçamentárias, mas aceitou aumentar o repasse da União em 30%. O problema é que, diante disso, o Estado decidiu reduzir no mesmo montante os próprios repasses, alegando que vinha assumindo uma despesa maior que sua obrigação.

“O que os consórcios querem? Que se cumpra o pacto federativo”, cobrou Ormesinda Salgado, complementando que o risco da continuidade dessa situação é a redução de equipes, paralisação do serviço e perda da capacidade de resposta. O impacto que já existe é a desvalorização dos servidores.

Baixo salário já reduz interesse pela profissão de condutor socorrista

Essa desvalorização, sobretudo dos condutores socorristas, foi bem explicada pelo secretário executivo do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Macro Sudeste (Cisdeste), em Juiz de Fora (Mata), Denys Carvalho. Segundo ele, em um concurso recente, houve 330 inscrições para técnico de enfermagem e apenas 12 inscrições para condutor socorrista. “São três anos sem nenhum tipo de recomposição a não ser por parte dos municípios. Isso é inviável. Nosso déficit é de cerca de R$ 20 milhões, fora os outros consórcios”, queixou-se Carvalho.

“Não é possível imaginar um condutor socorrista, com sua jornada exaustiva, receber R$ 1,5 mil ou R$ 1,6 mil”, protestou a diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sindsaúde), Núbia Dias. “Eles não são motoristas de ambulância, eles recebem um treinamento muito específico”, acrescentou ela.

Núbia Dias disse que o condutor socorrista não é reconhecido como trabalhador da Saúde. “Queremos que os trabalhadores do Samu façam parte da carreira única do Ministério da Saúde”, cobrou. E não são apenas os condutores socorristas que têm reivindicações. Técnicos de enfermagem afirmaram que o piso da categoria não vem sendo pago devidamente. Os representantes dos trabalhadores cobraram um financiamento adequado para os consórcios intermunicipais, para que estes possam pagar um salário justo aos profissionais.

O subsecretário de Acesso a Serviço de Saúde da Secretaria de Estado de Saúde, Renan Guimarães de Oliveira, disse que a ampliação do Samu foi uma prioridade desde 2019. Segundo ele, hoje o serviço já atende 795 dos 853 municípios mineiros, e todos devem ser atendidos até o início de 2026. “O aporte financeiro do Estado é significativo e não queremos abrir mão dele”, afirmou o subsecretário. “A gente quer discutir um financiamento justo. Hoje, 40% do valor, em média, é financiado pelo Estado”, destacou Renan de Oliveira.

Com relação à redução da contribuição feita pelo Estado em 2023, Renan de Oliveira afirmou que isso estava previsto em um acordo, com o objetivo de que o recurso financiasse a ampliação do serviço para todos os municípios mineiros.

O diretor do Departamento de Atenção Hospitalar, Domiciliar e de Urgência do Ministério da Saúde, Fernando Figueira, que representou a União no debate, destacou que foi o governo Lula que retomou o reajuste do financiamento federal ao Samu. Ele também afirmou que está para ser recebido para sanção do presidente da República um projeto de lei federal que reconhece o condutor socorrista como um profissional de saúde.

O dirigente federal afirmou que a ampliação do investimento federal esbarra na perda de controle do Executivo federal sobre o orçamento, em favor do Congresso. “Eu vou trazer a dureza da realidade. A gente está lutando contra um destrinchamento do orçamento onde a capacidade de investimento do Poder Executivo tem sido tensionada por forças que puxam para o Legislativo esse poder, que antes era discricionário do Executivo. Mas isso não significa que a gente vai se amedrontar”, disse Figueira.

Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais

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